CRÍTICAS E PONTOS DE ATENÇÃO DIRIGIDOS AO MARCO REGULATÓRIO DO SANEAMENTO

O MARCO REGULATÓRIO DO SANEAMENTO E A INICIATIVA PRIVADA
julho 20, 2020
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Sancionado com vetos do presidente da república (quinta feira – 15/07), fato que causou certa surpresa ao relator da proposta no Senado, senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), o novo Marco Legal do Saneamento Básico (Lei 14.026, de 2020) segue agora seu curso protocolar de avaliação pelo Congresso Nacional que discutirá a manutenção ou derrubada dos pontos excluídos pelo governo federal.

Aparte das possibilidades de ajustes decorrentes dos vetos presidenciais, o texto da Lei já vinha sendo criticado por alguns congressistas, revelando pontos de atenção à eficácia do alcance do objetivo principal da universalização da oferta de serviços de saneamento básico à população.

Aprovado sob a aura da emergência social e econômica provocada pela pandemia da Covid-19

Dentre as críticas recebidas, reside o fato de que a crise provocada pela pandemia da Covid-19 catapultou o interesse dos senadores pelo projeto que, ainda que complexo, foi aprovado com algumas emendas, porém sem maiores debates em sessões presenciais e sem o trâmite pelas comissões permanentes do Senado Federal.

Certamente a crise sanitária revelada pelo Covid-19 pautou a urgência da aprovação da Lei, expondo os efeitos da falta de saneamento básico amplo e de qualidade no país, e seus impactos na redução da capacidade de prevenção de doenças da população, impedida do acesso à água potável e exposta ao esgoto fluindo a céu aberto, contaminação de mananciais e proximidade de lixões.

Além disso, a agilidade do trâmite de aprovação da Lei, que estava parada no Senado desde o final do ano passado quando foi aprovada na Câmara do Deputados, promove grandes expectativas e estímulos à retomada do desempenho econômico e geração de empregos em momento crítico e de crise social e econômica. Este fato foi enfatizado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, que participou da cerimônia de sanção do novo marco, no Palácio do Planalto, dizendo: “Isso é um avanço importante e, também, destrava a primeira grande onda de investimentos”. E complementou, esclarecendo os próximos passos da estratégia econômica do governo: “…primeiro o saneamento, depois, vem a cabotagem, o setor elétrico, o gás natural, o petróleo, ou seja, nós vamos retomar o crescimento destravando os investimentos” (Fonte: Gov.br https://bit.ly/2ZIBsSq).

Empresas estatais terão que competir com empresas privadas.

Outra crítica que reverberou intensamente antes mesmo da aprovação da Lei pelo Senado recaiu sobre a desestatização do setor e as privatizações das empresas prestadoras de serviços de saneamento básico. Atualmente 94% das cidades brasileiras são servidas por empresas estatais, enquanto, pela nova Lei, se exige licitações e concorrência pública para os novos contratos de concessão, abertas à participação de empresas privadas, e se extingue os convênios sem licitação realizados por municípios e empresas públicas estaduais.

A propósito, um dos principais vetos realizados pelo governo, exclui do texto da Lei o trecho que permitia que as estatais que estejam operando a prestação de serviços de saneamento básico renovem seus contratos por mais 30 anos sem licitação. A justificativa do governo ao veto foi embasada na perspectiva de que o dispositivo seria contrário à promoção de competitividade e eficiência necessários às empresas do setor para que possam cumprir as metas assumidas de universalização da oferta de serviços de saneamento básico à população.

Concessionárias privadas atenderão as metas de universalização contratadas?

Alegam os críticos que a privatização do setor trará prejuízos à população, condenando regiões menos atraentes (menor potencial de lucro) a não serem servidas adequadamente pelos serviços de água e esgotos adequados e, ainda assim, terem que pagar preços majorados pelas tarifas praticadas pelas concessionárias privadas, devido ao fim do subsídio cruzado em que o lucro de uma área populosa custeia o prejuízo de municípios menores.

O contraponto ao argumento reside, primeiramente, na incapacidade histórica do modelo estatal atual de prover serviços adequados a essas mesmas regiões e populações mencionadas, além do que, a nova Lei estabelece o instituto dos “blocos”, permitindo que municípios menores se tornem atraentes para as empresas licitantes ao se consorciarem com outros municípios e estados para contratar serviços de forma coletiva.

Outrossim, dados do PPI – Programa de Parceria de Investimentos do governo apontam para o fato de que o setor privado responde, atualmente, por cerca de 6% do mercado nacional de saneamento, mas investe 20% do montante total aplicado, e que as concessionárias privadas investem, em média, 2,5 vezes mais que as estatais de saneamento, e as tarifas cobradas são similares às das empresas públicas (Fonte: PPI GOV.BR: https://bit.ly/2WAge77 ).

Na questão da definição tarifária, deve ser lembrado que a Lei prioriza a unificação de parâmetros de acompanhamento, monitoramento e controle, que deverão ser atendidos por todos os interessados (públicos e privados), com vistas a garantir a eficiência dos sistemas que serão implantados, o que demandará melhorias de processos técnicos e de gestão, fator que certamente deverá conduzir a ganhos de produtividade. Um ponto relevante a ser analisado nesse contexto reside na busca da redução de perdas nas redes de distribuição de água que, em 2016, apresentaram um índice médio de perdas de faturamento total no Brasil igual a 38,53%, englobando perdas físicas e comerciais – resultado que representa 23 pontos percentuais acima da média dos países desenvolvidos, que é de 15% (Fonte SNIS 2016: https://bit.ly/3jrJW8g ).

Outra questão que guarda relação direta com os custos de operação reside na localização dos mananciais e na topografia das regiões que, em função do adequado dimensionamento de equipamentos dos sistemas de captação e de adução de água bruta, certamente trarão impactos, além daqueles relacionados com os custos de aquisições e de instalações, nos níveis de consumo de energia, que representa um dos principais componentes da matriz de custos de operação dos sistemas.

Seguimos na contramão da história ao observar que o mundo segue no rumo da reestatização?

Outro ponto de atenção apontado pelos críticos da Lei e, especificamente, ao ponto da permissão de ingresso da iniciativa privada no setor, diz respeito a experiências de reestatização observadas em capitais e grandes cidades do mundo. Segundo apontou o estudo “Our Public Water Future” (2015) do Projeto de Serviços Municipais (MSP) – uma rede global de pesquisa que explora alternativas à privatização e comercialização da prestação de serviços em eletricidade, saúde, água e saneamento – “após três décadas de resultados frequentemente catastróficos, muitas cidades, regiões e países estão encerrando o capítulo sobre a privatização da água”. A fonte menciona 235 casos de remunicipalização da água registrados em 37 países e em cidades como Paris (França), Berlim (Alemanha), Buenos Aires (Argentina), Budapeste (Hungria), La Paz (Bolívia) e Maputo (Moçambique) (Fonte: MSP: https://bit.ly/2ONPoEi ).

Por outro lado, não há como se esquivar da incapacidade de promoção de investimentos públicos imediatos no setor e da histórica ineficiência estatal, observadas algumas exceções, no atendimento de serviços de saneamento básico amplo e de qualidade à população. Este fato evidencia a demanda premente da atração de investimentos da iniciativa privada ao projeto, obviamente, resguardando-se os interesses públicos envolvidos.

Lucro e dividendos só se revelam diante da eficiência!

Se o lucro e a distribuição de dividendos são fatores que impulsionam a empresa privada no sentido da nova oportunidade, certamente sua garantia está associada à perseguição da eficiência e a eficácia operacional, fator que vai ao encontro do que almeja a nova Lei que preconiza a uniformização do monitoramento e o controle de parâmetros de desempenho, tais como: indicadores de qualidade da água, de perenidade de fornecimento, de aumento de áreas de cobertura de redes de água e esgoto, os quais, por sua vez, serão requeridos tanto das empresas estatais estaduais e autarquias municipais, quanto das empresas privadas.

Aprendendo com as experiências e falhas internacionais.

A atenção ao texto da nova Lei recém aprovada se alavanca nas experiências internacionais e institui instrumentos regulatórios e de gestão que procuram suplantar as evidências de falhas observadas. Dentre estas destaca-se o fortalecimento da ANA (Agência Nacional de Águas), empoderada para oferecer ajuda técnica e financeira para que municípios e blocos de municípios implementem seus planos de saneamento, assim como, a criação do Comitê Interministerial de Saneamento, sob a presidência do Ministério do Desenvolvimento Regional, visando assegurar a implementação da política de saneamento básico e de coordenar a alocação de recursos financeiros.

Outro instituto previsto na Lei, define regras para subsídios e gratuidades oferecidos à famílias de baixa renda.

Se a experiência nacional entrará para a lista de “micos” ou não, só o tempo dirá.

De qualquer modo, o direito da população brasileira ao acesso à água potável e coleta e tratamento de esgotos, independentemente de sua situação sócio econômica e geográfica, tem sido revelado e priorizado no debate de tramitação da Lei. Se não há justificativas plausíveis para se privatizar empresas públicas que, atualmente, prestam serviços de qualidade, também não há que se criticar e fechar o mercado para empresas privadas que se disponham a investir no setor. Existe um preço histórico, merecido, a ser pago à população nesse quesito e essa dívida, no mínimo, vem sendo exposta.

A Schédio Engenharia é uma empresa orientada para a oferta de soluções de Engenharia Consultiva e Gestão que dispõe de experiência no segmento de saneamento básico. A sequência desta série de artigos irá abordar os aspectos considerados relevantes nessa jornada de preparação das empresas privadas para os desafios e conquistas da nova lei.
Por:

Alonso Mazini Soler, Doutor em Engenharia de Produção POLI/USP, Professor da Pós Graduação do INSPER, da FIA e da Plataforma LIT-Saint Paul. Sócio da J2DA Consultoria & Treinamento e da SCHÉDIO Engenharia Consultiva – alonso.soler@schedio.com.br

José Messias Viegas Alves, Engenheiro Civil e Administrador de Empresas. Sócio da SCHÉDIO Engenharia Consultiva – jose.messias@schedio.com.br

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1 Comentário

  1. Excelente artigo sobre as perspectivas de investimentos e melhoria do saneamento!

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